quarta-feira, 22 de agosto de 2012

A Boemia me Trouxe Até Aqui Por Estar Passando Dos Limites

Quando me tiraram o chão, eu voei. Quando me tiraram as asas, eu caí. Pra sempre eu caí, pois nada mais satisfasia o mal-estar da negritude que se espalhava em meu peito.
E por fim cancelei os sentimentos, transcendi.
Não foi uma nem duas vezes que cansei do que vi.
O passado ainda é presente na sentença. Mesmo que o passado ainda vá acontecer.
E todo aquele tempo foi pro ralo, todas as memórias são gotas que batem no chão como perturbam meu sono, convergindo para o ralo do esquecimento. A adimiração ficou.

O espelho só reflete uma direção.
E quando me tiraram o espelho da frente, finalmente eu a vi.

Já passei por coisas piores muito mais bêbado.
Já tentei controlar horizontes com meus sonhos planejados. Já tentei caminhar na brita sem calçados.
Eu sei que soa estranho resmungar, mas às vezes tem-se que dizer que já não é o vento que sopra pela caravela e a faz mover. Soa estranho resmungar porque a voz não sai por completo, como por incompleto deu-se o movimento, quando de mim retiraram-se as asas do conhecimento. 

A tua indiferença me faz superar a ignorância.
Me faz entender que não preciso de espelhos pra ver quem eu sou.

Era o fim de uma noite, quando raiou o dia.
E eu cansado fui deitar, a cama cheia de insetos e estrelas. A cama cheia de núvens, e nenhum diálogo para me ocupar. O problema mesmo é essa insônia. São poucos os dias que ela me deixa em paz. São poucos dias que consigo refletir o céu sem usar um espelho, ou asas pra voar e vê-lo de cima. Nunca pedi por isso.

Quando acordo isso apenas está.

sábado, 4 de agosto de 2012

Marcação

-Já terminou?
-Não, ainda não.
-O que falta?
-Nada.
O primeiro dá um passo à frente, e com ansiedade pergunta ainda mais alto:
-Então como não terminou?
O segundo dirige-se à saída do cômodo, e diz ainda na porta:
-Não faltava nada desde o começo.
O primeiro não sabia o que dizer, ficou apenas olhando a parafernalha sobre a mesa. O segundo virou e saiu. Quando ele o fez, o outro sentou e ficou olhando para aquilo, pensando. Parecia entristecido com a falta de problemas, afinal, havia pagado para que o homem os solucionasse. Tirou do bolso um canivete, e começou a tentar ele mesmo arrumar.
Após várias tentativas desistiu. Acabou por deixar em cima da mesa, e dirigir-se à cozinha, para tomar um café. Achou que tudo se iluminaria com a mente um pouco mais agitada, estava focado completamente em seu dilema: como encontrar o problema? 
O segundo voltou, e trouxe algumas sacolas com coisas dentro, colocou-as sobre a mesa e tirou seu conteúdo. Misturando ao que já havia sobre a mesa. Sentiu o cheiro de café recém passado, e foi até a cozinha. 
-Eu trouxe mais.
O primeiro o olhou arregalado. Foi até a sala de entrada e tocou os objetos sobre a mesa.
-E agora, como vai saber? Como vai diferenciar?
-A diferença muitas vezes é a própria indiferença.
Sentou-se o primeiro, sentou-se o segundo. Os dois passaram horas juntando e organizando os objetos, ditados pelo homem mais acostumado a resolver esse tipo de situação. Tempo depois:
-Ok, entendi que está tentando me fazer de idiota. Pare de fazer rodeios e encontre logo o problema.
-Em que parte do objeto você está focado?
O primeiro hesitou:
-Na parte que me é útil, na parte que fará o objeto servir para o que sempre serviu! - respondeu com convicção.
O homem sorriu e disse:
-Para modificar esse objeto e deixá-lo ao seu gosto, terei de arruiná-lo.
-Então qual é o problema?
-Não há. Não com o objeto.
O primeiro mais um vez calou-se, e ficou olhando o trabalho empenhado do homem. Agora com uma expressão mais séria.
-Terminei.